Quarta-feira, 08 de março de 2023
O novo governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) assumiu em janeiro. Com ele, surgiram questionamentos sobre como serão os próximos quatro anos, principalmente em relação aos impactos das decisões políticas que poderão afetar o agronegócio brasileiro.
Após anos difíceis, devido à pandemia do Covid-19, o Banco Central do Brasil informou que em 2022, a economia do país cresceu 2,9%. No agronegócio, em dados divulgados em 19 de janeiro, pela Confederação Nacional da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), o Valor Bruto da Produção (VBP) ficou em R$ 1,32 trilhão, apesar do Produto Interno Bruto (PIB) do setor ter recuado.
Em 2023, o Brasil deverá ter uma safra recorde de grãos. Por isso, as projeções em um primeiro momento deverão ser de crescimento na agropecuária. Mas o que fica no ar é como o governo irá apoiar o setor, já que parte do seu sucesso depende das políticas adotadas.
Ivan Wedekin, profissional com ampla experiência em economia agrícola e que já foi secretário de Política Agrícola do Ministério da Agricultura, afirma que a preocupação, nestes primeiros meses do novo governo, é com a expansão de gastos públicos, gerando desequilíbrio nas contas fiscais do governo. Com estas ações, a tendência é de juros elevados em toda a economia. “A grande questão é como vai ser o desenho da política agrícola, com o Plano de Safra 2023/2024, que entra em vigor a partir de 1º de julho. Estes próximos meses serão de discussão da configuração em termos de volumes de recursos e taxas de juros”, observa.
Para Wedekin, uma escolha infeliz do Governo Federal foi a fragmentação que o Ministério da Agricultura Pecuária e Abastecimento do Brasil (MAPA) sofreu com a recriação do Ministério de Desenvolvimento Agrário, Ministério da Pesca e Aquicultura e transferência de áreas para o Ministério do Meio Ambiente. “Quando você tem quatro donos dirigindo um negócio, essa sociedade fica mais complexa do ponto de vista da gestão. E estes quatro ministérios estão diretamente envolvidos com a questão da agropecuária. Sem contar a presidência da república, Casa Civil, Ministério da Economia, Planejamento e Banco Central. Então, vai haver uma necessidade de articulação muito grande dos ministros envolvidos nesta área. Esta fragmentação representou perdas de cargos relevantes para o ministério, especialmente na Defesa Agropecuária. Administrar uma agropecuária multifacetada será um grande desafio, não só para o ministro de Agricultura, como para os demais ministros, para que não percamos eficiência nestas mudanças”, analisa.
A REVISTA DO PRODUTOR RURAL também conversou com o deputado federal Pedro Lupion, que assumiu a presidência da Frente Parlamentar Agropecuária (FPA). A preocupação do político é a mesma em relação à nova formatação do Ministério da Agricultura. “Enviaram a Conab, o Abastecimento, e a Agricultura Familiar para o Ministério do Desenvolvimento Agrário. Como é que faz Plano Safra e pensa a estratégia da nossa agropecuária separando pequenos, médios e grandes agricultores?”, questiona.
Sobre a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), especificamente, Lupion conta que há uma proposta de tornar a companhia uma agência, como acontece nos Estados Unidos. Conforme ele, a FPA não é contrária a esta ideia, mas que se assim acontecer é necessário que ela volte para a pasta da Agricultura.
O deputado declara ainda que a Frente Parlamentar Agropecuária, em um primeiro momento, não será oposição e nem situação ao Governo Federal, ainda que a maioria dos membros sejam de oposição. “Precisamos buscar convergência, construir pontes para vencer os desafios que teremos pela frente. Somos mais de 300 parlamentares interessados apenas na defesa dos interesses dos produtores rurais brasileiros. Nosso objetivo é que haja menos discurso ideológico e mais pensamento técnico e lógico. O agro gera 1/3 dos empregos, é o setor que mantém nossa balança comercial positiva, e é fundamental para o desenvolvimento do país. Nossa atuação dependerá dos movimentos do governo. Se agirem a favor dos produtores terão nossos aplausos. Se continuarem a atuar contra o agro, terão nossa mais intransigente oposição”, avisa.
Sobre o novo governo e seus impactos no agronegócio, a REVISTA DO PRODUTOR RURAL teve a oportunidade de conversar com um grande nome para o agronegócio brasileiro, o ex-ministro da Agricultura e atua presidente da Abramilho, Allysson Paolinelli. Como as opiniões anteriores, ele não concorda com a reestruturação do Ministério da Agricultura, mas acredita que o ministro Carlos Fávaro tem potencial para ser um bom coordenador da pasta. Isto se deve a sua experiência como agropecuarista e outras funções, como por exemplo, diretor da Associação de Produtores de Soja (Aprosoja), no Mato Grosso e secretário do Meio Ambiente no mesmo estado. “Ele entende de agronegócio, esperamos que faça algo pelo nosso setor”.
Para Paolinelli, a maior preocupação nas últimas decisões políticas em relação ao agronegócio diz respeito a uma decisão tomada ainda em outubro de 2022, pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Luís Roberto Barroso, referente às invasões de propriedades privadas. Ele determinou, na época, que os tribunais que tratam de casos de reintegração de posse instalem comissões para mediar eventuais despejos, antes de qualquer decisão judicial. A justificativa de Barroso foi que isto poderia reduzir os impactos habitacionais e humanitários em casos de desocupação coletiva. “Isto é um absurdo e não podemos aceitar”.
Ele espera que Fávaro, como Ministro de Agricultura, tenha como pauta prioritária resolver esta insegurança jurídica que os produtores rurais poderão sofrer, ao ter suas propriedades invadidas.
Safra 2023/2024 na região de Guarapuava
Após uma safra difícil em 2021/2022, quando o agronegócio sofreu com perdas significativas, principalmente devido às estiagens severas que atingiram predominantemente o sul do Brasil, a expectativa para esta o ciclo de 2022/2023 é positiva.
O Departamento de Economia Rural (Deral) da Secretaria de Agricultura e Abastecimento (Seab) prevê uma produção de 21 milhões de toneladas de soja, o equivalente a nove milhões a mais de grãos do que na safra passada.
No Núcleo Regional de Guarapuava da Seab, a estimativa de produção é de um pouco mais de 1,205 toneladas de soja e 666.700 toneladas de milho. Ambas produções são maiores que na safra passada, com aumento da área plantada de soja e redução na área de milho.
Bruno Silva Dandolini, coordenador técnico da Cooperativa Agrária, uma das cooperativas de maior expressão na região de Guarapuava, informa que são esperados bons resultados tanto para a soja, quanto para o milho nas áreas dos produtores cooperados. A produtividade deverá ficar em 12.500 kg/ha de milho numa área de 31 mil hectares e 4.300 kg/ha de soja, em 84 mil hectares. “Quanto à soja, estamos trabalhando com este número de forma conservadora. Mas temos muito tempo ainda até a colheita, então imaginamos que esse número será mais alto, se tudo der certo”, observa.
Neste momento, o maior entrave desta safra, conforme Dandolini foram os atrasos nas janelas de plantio destas culturas e em alguns estágios de desenvolvimento. “A expectativa é que nos primeiros milhos plantados teremos um atraso de 20/25 dias e para os plantados mais tarde, de 12 a 15 dias de atraso na colheita. Mas de uma forma geral, os milhos estão se desenvolvendo bem. Vale observar que tivemos bastante frio no início do desenvolvimento da cultura. Portanto, as áreas plantadas primeiro poderão ter algum efeito sobre a produtividade”, comenta. A expectativa é que grande parte da colheita do milho na região inicie no final de fevereiro.
Quanto à soja, houve até 30 dias de atraso em algumas áreas e segundo o coordenador técnico da Agrária, as variedades escolhidas pelas cooperativas são de ciclo precoce, posicionadas de forma adiantada. “Porém, apesar disso poder impactar no potencial produtivo, as condições ambientais estão muito favoráveis para o desenvolvimento da soja, com chuvas regulares, intercaladas com períodos de sol, com bastante radiação e isso é benéfico para a cultura”, comenta Dandolini.
A maior preocupação daqui para frente com a soja é controlar a ferrugem e a esclerotinia (mofo branco), que pode aparecer devido às chuvas mais abundantes entre o final de janeiro e início de fevereiro, além da temperatura amena, condições ideais para o desenvolvimento da doença.
Na Fazenda São Pedro Dois Pinheiros, em Pinhão (PR), o produtor Ricardo Marcondes Teixeira plantou soja. Ele espera colher de 4.000 a 4.500 kg/ha do grão. O produtor observa que a cultura estava se desenvolvendo muito bem e o clima vinha colaborando com chuvas regulares. Porém, o aumento do volume de chuvas, na metade de fevereiro, poderia vir a atrapalhar, resultando no aumento de doenças como o mofo branco e a ferrugem asiática. O milho, na propriedade, foi plantado apenas para a produção de silagem.
A maior preocupação do produtor rural, no momento, são os altos custos de produção e a instabilidade do mercado pelas possíveis baixas nos preços das commodities. Além do aumento de juros no custeio para próxima safra e a insegurança da transição política atual.
Outro produtor rural com expectativa boa para esta safra é Valdir José Fuchs Filho. Ele planta nas fazendas Três Marias, Treviso e Capile, em Guarapuava e Candói. A lavoura de soja nesta safra foi de 1000 hectares e de milho 350 hectares. “As lavouras estão em condições muito boas. Chuva na medida certa e pouca pressão de pragas e doenças”, conta. Ele espera ter uma produtividade de milho de 13.500 kg/ha e na soja de 4.200 kg/ha.
Agrária alerta para o cuidado com a cigarrinha do milho
O engenheiro agrônomo da Fundação de Pesquisa Agrária de Pesquisa Agropecuária (FAPA), Ferdinand Stoetzer alerta os produtores para infestação de cigarrinha do milho na região. Segundo ele, os sintomas de enfezamento estão muito visíveis nas lavouras. “Este problema chegou há duas safras e o produtor precisa se conscientizar que veio para ficar”.
A FAPA tem feito um acompanhamento da cigarrinha e todos os anos uma alta população é identificada. O único meio de sanar a praga e diminuir os danos é que todos os produtores façam o manejo adequado.
Dandolini acrescenta ainda que não adianta um produtor fazer o controle e manejo adequado. É preciso que toda a região aja de forma intensiva. “Somente o manejo em conjunto faz a população reduzir e chegar em níveis aceitáveis”, reforça.
Outro ponto que Stoetzer ressalta é que ainda se ouve produtores falando que a cigarrinha, na região, não está infectada com molicutes, que são os responsáveis pelo enfezamento no milho. Mas isso não é verdade, de acordo com o técnico. “Praticamente, toda cigarrinha está infectada sim e temos que considerar ela como um vetor”.
O coordenador técnico finaliza alertando os produtores quanto aos principais cuidados para evitar a disseminação da doença: “Todo mundo que planta milho tem que seguir o manejo de forma integrada. Desde o controle de milho guaxo, evitando a multiplicação da cigarrinha, escolha do híbrido certo e plantio na época correta. Além do manejo químico, quando o milho começar a emergir. É preciso que eles façam a aplicação e não negligenciem o controle, achando que a cigarrinha não está infectada”.